O novo CPC enunciou em seu art. 1.015 as hipóteses de cabimento do agravo de instrumento. Desde a publicação da lei, a doutrina procurou desvendar se o rol de hipóteses de cabimento do recurso seria taxativo ou exemplificativo, ou, ainda, se caberiam interpretações restritivas ou extensivas.
Fato é que o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Tema n. 988 em sede de recursos repetitivos, consolidou o entendimento no sentido de que “o rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação.”
Em recente julgamento do REsp 1.925.492-RJ, de relatoria do Min. Herman Benjamin, noticiado pelo Informativo de Jurisprudência n. 695, o Superior Tribunal de Justiça novamente enfrentou a discussão a respeito das hipóteses de cabimento do agravo de instrumento diante da inovação trazida pelo novo código processual.
Dessa vez, a ação originária consistiu em ação de improbidade administrativa e a parte recorrente se insurgiu por meio de agravo de instrumento contra a decisão que indeferiu o pedido de depoimento pessoal da parte ré. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro entendeu incabível o recurso por não se encontrar dentre as situações previstas no art. 1.015, do CPC, compreendendo ser igualmente inaplicável à ação de improbidade o artigo 19, parágrafo 1º, da Lei n. 4.717/1965, porque a lei se referiria à ação popular:
Art. 19. (...)
§ 1º Das decisões interlocutórias cabe agravo de instrumento.
Porém, o STJ decidiu de forma diversa. De acordo com o Ministro Relator, “a ideia do microssistema de tutela coletiva foi concebida com o fim de assegurar a efetividade da jurisdição no trato dos direitos coletivos, razão pela qual a previsão do artigo 19, § 1º, da Lei da Ação Popular (“Das decisões interlocutórias cabe agravo de instrumento”) se sobrepõe, inclusive nos processos de improbidade, à previsão restritiva do artigo 1.015 do CPC/2015.”
Portanto, seria cabível o agravo contra qualquer decisão interlocutória em ações componentes do microssistema de tutela coletiva – inclusive ações de improbidade –, e não apenas nas hipóteses do art. 1.015 do CPC.
Esclarecendo ainda mais o tema, destacou o voto:
Nesse sentido: “Os arts. 21 da Lei da Ação Civil Pública e 90 do CDC, como normas de envio, possibilitaram o surgimento do denominado Microssistema ou Minissistema de proteção dos interesses ou direitos coletivos amplo senso, no qual se comunicam outras normas, como o Estatuto do Idoso e o da Criança e do Adolescente, a Lei da Ação Popular, a Lei de Improbidade Administrativa e outras que visam tutelar direitos dessa natureza, de forma que os instrumentos e institutos podem ser utilizados com o escopo de ‘propiciar sua adequada e efetiva tutela’” (REsp 695.396/RS, Primeira Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJe 27.4.2011).
Outro ponto importante do acórdão foi a menção ao entendimento do próprio Tribunal da Cidadania no sentido de que “o Código de Processo Civil deve ser aplicado somente de forma subsidiária à Lei de Improbidade Administrativa. Microssistema de tutela coletiva”, a exemplo do REsp 1.217.554/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 22.8.2013.
Tal interpretação igualmente encontra lastro no próprio artigo. 1.015, que em seu inciso XIII prevê cabimento do agravo em “outros casos expressamente referidos em lei.”
Por isso, o Relator concluiu que “a norma específica inserida no microssistema de tutela coletiva, prevendo a impugnação de decisões interlocutórias mediante agravo de instrumento (art. 19 da Lei n. 4.717/65), não é afastada pelo rol taxativo do art. 1.015 do CPC/2015, notadamente porque o inciso XIII daquele preceito contempla o cabimento daquele recurso em ‘outros casos expressamente referidos em lei”, conforme decidido no AgInt no REsp 1.733.540/DF, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 4.12.2019).
O entendimento resulta na aplicação indiscriminada do agravo de instrumento a todas as decisões interlocutórias no âmbito do microssistema da tutela coletiva, em similitude ao que era previsto no CPC de 1973.
Colhe-se, então, que o STJ compreende atualmente que se aplica à ação de improbidade administrativa o previsto no artigo 19, § 1º, da Lei da Ação Popular, segundo o qual das decisões interlocutórias cabe agravo de instrumento ¬– sem restrições e de forma genérica –, afastando-se a incidência primária da taxatividade mitigada do art. 1.015, do CPC, em razão do reconhecimento do microssistema da tutela coletiva.
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