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Joane Lopes de Lima

Direito digital como fonte da revelação do anonimato em casos de ilícitos cometidos na internet

Como escritório de advocacia especializado em Direito Digital, é muito gratificante participar do início de grandes discussões e estratégias para melhorar a eficiência e celeridade nos processos judiciais nos quais envolvem réus indeterminados no campo digital.

 

Isso acontece quando somos formadores de opiniões, quando aprendemos, estudamos e                       colaboramos com a sociedade e melhores estratégias para a celeridade da justiça, buscando soluções jurídicas concretas.

 

De fato, foi necessário muito tempo de estudo para chegar até aqui, como nos temas relacionados à identificação de réus indeterminados, que usufruem do anonimato para cometer ilícitos na internet.

 

Nesse contexto, é necessário que os profissionais do Direito, especialmente juízes e advogados, adotem uma abordagem flexível e criativa em relação às normas processuais existentes. É preciso encontrar soluções rápidas, eficazes e econômicas para fornecer uma tutela jurisdicional adequada às particularidades dos litígios dessa natureza, até que sejam criadas regras apropriadas pelo ordenamento jurídico nacional, caso isso venha a ocorrer.

 

É importante esclarecer que o Direito Digital está presente há bastante tempo no dia a dia do cidadão brasileiro e tem influenciado quase todos os demais ramos já consolidados do Direito Constitucional ao Civil, passando pelo Penal e do Consumidor.

 

Cabe iniciar a discussão a respeito de casos envolvendo réus indeterminados.

 

Em 2014 foi aprovada a Lei nº 12.965/2014, conhecida como Marco Civil da Internet, que trouxe previsões específicas sobre os procedimentos de coleta, uso, armazenamento, tratamento, compartilhamento e exclusão de dados pessoais dos usuários da Internet, tratando também sobre produção de provas no casos de ilícitos praticados pela Internet, além de capítulos lidando com antecipação de tutela e competência para propositura de ação envolvendo serviços de Internet.

 

Mesmo com um ordenamento jurídico tão vasto de debate, fica inerte sobre o assunto de ilícitos cometidos por pessoas que se valem do anonimato para dispararem o discurso de ódio, stalking, crimes contra a honra, entre outros.

 

Todavia, é importante registrar que sempre há um limite entre a diversão e o abuso, ou seja, quem opta por criar perfis fakes nas redes sociais para buscar o anonimato tecnológico pode ultrapassar o limite e cometer crimes contra a honra, tais como calúnia, difamação e injúria, sendo possível, a pretensão jurisdicional, tanto cível como criminal.

 

A mesma prática pode incorrer também em crime de falsa identidade quando atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem. Além disso, poderá incidir a repercussão cível em que a pessoa lesada poderá requerer ressarcimento em danos morais pelo dano causado.

 

Neste mesmo entendimento, o processo civil necessita adequar-se ao direito material, que são situações que ocorrem sempre no direito digital, sendo assim, compete ao juiz em casos que ocorra omissão do legislador realizar a devida adequação processual, para que alcance a materialização do direito entre as partes.

 

Essa afirmação é ainda mais enfática nos casos que envolvem direito digital, especialmente quando há prática de atos ilícitos pela internet por pessoas desconhecidas, que se escondem por trás do anonimato, que é proibido pela Constituição por meio do art. 5º, IV, da CF.

 

Dessa maneira, a legislação do Marco Civil da internet dispõe em seus Arts. 19, 22 e 23, a garantia de obter por meio judicial registros de aplicação e de conexão para fins de fazer prova em processos civis e criminais, certificando o direito do ofendido.

 

Todavia, não é uma tarefa fácil, tendo em vista, que o acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania, e ao usuário são assegurados de direitos como a inviolabilidade da intimidade e da vida privada, sua proteção e a inviolabilidade e sigilo do fluxo de suas comunicações pela internet, previstos no Art.7º art., inciso I da Lei do Marco Civil da Internet, dessa maneira, se o advogado não dispuser de conhecimento na área digital, fica inviável conseguir a derrubada do conteúdo ilegal e obtenção dos dados do ofensor.

 

Todavia, cumpre esclarecer, que existe a exceção nos casos de pornografia, onde a exclusão do conteúdo pode ser requerida extrajudicialmente e de forma imediata, ou seja, diretamente ao provedor de aplicação, conforme o Art. 21 da Lei 12.965/2014, no qual se o provedor não realizar a retirada do conteúdo ele responde aos danos causados ao ofendido.

 

Vale ressaltar, que as lides que não envolvem situações de pornografia, o ofendido deve sempre ajuizar ação judicial para que ocorra exclusão do conteúdo tido por ilícito, solicitando assim, a obtenção dos dados de IP do servidor de aplicação, no qual remeterá as informações ao processo, com os dados do IP disponíveis pode-se investigar em quais provedores de conexões eles estão logados ou cadastrados, para então, realizar a obtenção dos dados cadastrais do servidor de conexão (Vivo, Claro, Oi, Net, etc.), para só então, chegar-se ao titular da conexão de onde foi praticada a ilegalidade, que eventualmente será acionado civil ou criminalmente por conta do ilícito praticado.

 

Mas, como atuar nessa eficiência com o processo civil, sem que ocorra uma demora na pretensão jurisdicional? Para esta prática, é necessário criar estratégias para melhor atender as expectativas do cliente, buscando a celeridade processual e conhecimento para analisar os dados expostos dos provedores.

 

Analisando as alternativas disponibilizadas pelo legislador, nota-se que a depender da estratégia processual escolhida, somente será possível obter a efetiva prestação jurisdicional com diversas ações ajuizadas de forma sucessiva, e conforme o caso, podendo ultrapassar até mesmo 05 ações cíveis.

 

Ou seja, mesmo que nos casos em que se requeira uma produção antecipada de prova, ou ainda, uma tutela de urgência em caráter incidental, a crise jurídica não se resolve somente no cerne de uma ação. Isso decorre do fato de ser comum essas medidas serem perpetradas em face dos provedores de aplicações, buscando a condenação em obrigações de fazer.

 

Sucessivamente, em uma nova ação, pleiteia-se em face dos provedores de conexões a obtenção dos dados necessários à identificação do possível legitimado ao polo passivo da ação que seria a “principal”. Nesse breve relato já se citaram, no mínimo, três ações judiciais, com todos os custos que gravitam em torno da movimentação da máquina estatal, e a possível sucumbência para obter os dados identificadores.

 

Além disso, o princípio da razoável duração do processo estaria, no mínimo, comprometido, diante do cenário do Poder Judiciário, com excesso de demandas e longos prazos para efetiva prestação jurisdicional.

 

Diante desse cenário, o legislador processualista consagrou mecanismos que asseguram as partes a possibilidade de evitar o excesso de demandas judiciais, bem como, a preservação do princípio da razoável duração do processo.

 

Podemos afirmar que isso decorre do princípio da cooperação das partes consagrado no art. 6º do CPC, em que, as partes devem cooperar entre si para a obtenção de uma prestação jurisdicional justa, de qual, o juiz é integrante e deve cumprir este preceito.

 

Não obstante, no tópico que inaugura a petição inicial no diploma processualista, o legislador ordinário dispõe ainda que o autor pode solicitar a cooperação do magistrado quando não dispuser dos meios necessários à identificação do legitimado passivo. E como então utilizar essas deixas do legislador e aplicar no âmago dos processos que envolve demandas digitais?

 

A melhor solução nesses casos é promover a ação, informando que no polo passivo se trata de réu indeterminado, e que naquele momento processual, o autor não dispõe dos dados necessários à sua identificação, entretanto, apresenta as informações, ainda que mínimas, a respeito de quem se quer identificar, como por exemplo, o nome do usuário nas redes sociais, acompanhados do URL.

 

Ademais, o próprio CPC dispõe ser possível a exibição de documentos em poder de terceiros, nos termos do art. 401 e seguintes, sendo plenamente aplicável nesses casos, pois, os provedores de aplicações possuem os registros de IP, e com este documento em mãos, identifica-se o provedor de conexões, que também exibirá documentos, estes que conterão os dados de identificação. Em síntese, em caráter incidental, no bojo de uma tutela de urgência, solicita-se ao juízo que os provedores de aplicações sejam oficiados para exibirem esses documentos, no qual consta o IP do réu indeterminado. Ainda no mesmo pedido, deixa-se claro, que após o cumprimento desta exibição, identifica-se qual é o provedor de conexão, para que este também seja oficiado, e apresente os dados cadastrais daquele IP.

 

O detalhe de toda essa exposição é que, os provedores de aplicação e de conexão em todas as alternativas possíveis prevista no ordenamento, seriam partes na lide, provavelmente como demandadas em uma obrigação de fazer. Neste cenário, esses provedores passam a ser apenas terceiros, devendo apenas cumprir o ônus de exibir os documentos, sem sucumbências para o autor da demanda.

 

Diante disso, é possível realizar apenas uma ação de indenização contra réu(s) indeterminado(s) violador(es) da lei para fins de responsabilização civil, com a descoberta da identidade por ofícios sucessivos ao provedor de aplicação (identificação do IP), inclusive para fins de remoção liminar e provedor de conexão (identificação do violador), como a disponibilização dos dados pessoais dos violadores, em seguida de emenda para consolidação do polo passivo da demanda no violador da lei identificado pelos ofícios.

 

A temática dos processos envolvendo violações da lei praticados pela via digital ainda é nova, embora tenda a se tornar cada vez mais comum com o passar dos anos. Demanda dos operadores do Direito um mínimo conhecimento de questões técnicas ligadas ao tema.

 

O Direito Digital surge como uma área adicional de especialização para os advogados, uma vez que a internet influencia praticamente todos os aspectos de nossas vidas. Com a crescente importância da tecnologia, compreender as suas nuances torna-se fundamental para qualquer profissional do direito.

 

Afinal, conforme já explicamos antes, em todos os ramos do direito existem aplicações do direito digital. Quem deseja atuar especificamente nessa área, porém, precisa se empenhar e buscar um conhecimento mais profundo sobre algumas tecnologias.

 

É ideal que o advogado tenha interesse pela tecnologia e esteja ciente de que nunca pode parar de estudar, pois a área está em constante evolução, com novos avanços e dilemas éticos e legais surgindo a cada mês.

 

O profissional também deve se acostumar a pensar um pouco além do convencional, já que, em boa parte dos casos, não há leis específicas para dispor sobre delitos que acontecem no ambiente virtual. O fato é que o direito digital é uma realidade que não se pode ser ignorada, nem por advogados especializados em áreas mais tradicionais do direito.


A AUTORA

Joane Lopes de Lima:

Sócia Fundadora, Advogada Especialista em Direito Digital pela IES Damásio, Pós-Graduanda em Advocacia Consultiva.

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